segunda-feira, 26 de abril de 2010

25 anos de Nova República

O mais longo período democrático da nossa história
A chamada Nova República, instaurada no País após o fim do regime militar, não acabou apenas com a ditadura. Deu lugar ao maior período de estabilidade democrática ininterrupta vivido pelo Brasil em toda a sua História. Personagens até então mantidos à margem da vida política ganharam voz, direitos políticos e se tornam também protagonistas da própria história.




Mas para Ana Lúcia Gomes, historiadora e professora do Departamento de Museologia da Universidade de Brasília (UnB), a Nova República representa também a abertura do País para encarar de frente sua diversidade. A conquista da cidadania pelas minorias – analfabetos, mulheres, negros, indígenas, homossexuais – marca a cara do novo momento político brasileiro.



“Os brasileiros desprivilegiados historicamente vêm se empoderando dos mecanismos que os favorecem. Isso é extremamente positivo”, afirma a historiadora. Para ela, esse é o maior momento de democracia na sociedade brasileira.



Constituição de 1988: divisor de águas



O deputado José Genoíno (PT-SP) acredita que a Assembleia Constituinte formada para criar a constituição da Nova República do Brasil foi o passo mais importante tomado pelo País após a queda do regime militar. Vale lembrar que o PT não assinou a nova Constituição por considerá-la pouco democrática.



Mas Genoíno admite: “Foi um momento em que o Brasil, apesar das crises econômicas e sociais, deu um passo fundamental no sentido da conquista democrática.” Para ele, os movimentos sociais legitimaram a democracia.



Ana Lúcia concorda que o cenário criado pela Constituinte foi interessante para a sociedade brasileira. Para ela, a densidade histórica do documento reflete a trajetória política vivida pelo povo brasileiro. “A quantidade de emendas, tantas vezes criticada, está aí para mostrar que a lei tem que se adequar à sociedade”, analisa.



Primeiro presidente da República depois do regime militar, José Sarney (PMDB-AP), hoje é presidente do Senado. Na época chegou a declarar que a nova Constituição tornaria o Brasil ingovernável. Hoje, Sarney pondera: “Nas outras constituições, a organização econômica teve preferência. A Nova República se caracteriza por introduzir termos sociais na constituição. A cidadania pôde ser exercida na sua totalidade e aprofundou a sociedade democrática.”



Para Sarney, a prova do avanço no processo social imposto pela Constituição da Nova República é a figura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva: "Um metalúrgico no posto mais alto da República, justo nesse período de comemoração dos 25 anos e e saindo-se tão bem, é sinal de que hoje vivemos numa sociedade democrática."



De fato, o ex-presidente do PSDB, senador Tasso Jereissati (CE), avalia a consolidação do processo democrático como o principal marco deste período. "A Nova República foi o grande momento da virada deste processo democrático conduzido com genialidade pelo ex-presidente Tancredo Neves. A democracia foi a maior contribuição para pacificar as relações com as bases da sociedade, como os movimentos sociais", diz Tasso.



No entanto, o tema ainda gera polêmica entre acadêmicos. Francisco Assis de Queiroz, professor do Departamento de História de Universidade de São Paulo (USP), acredita que o Brasil precisa privilegiar interesses comuns e não particulares para tornar-se uma democracia consolidada.



“Consolidar uma democracia não significa fazer uma mudança de governo formal e ter eleições. As pessoas precisam ter participação de fato nas decisões do País. A política deve representar os interesses da população e não atender interesses privados”, critica o historiador. “Houve uma importante mudança institucional e tivemos conquistas sociais, mas há problemas que perduram na história brasileira”, comenta Francisco.



O professor enumera a desigualdade na distribuição da renda, o acesso precário à educação e à saúde e condições de infra-estrutura nas cidades como problemas ainda não enfrentados pelos políticos brasileiros. “Acho que nenhuma mudança estrutural importante virá de Brasília se não houver pressão e exigência da sociedade”, diz. Para ele, as pessoas precisam se unir em prol de causas que privilegiem todo o Brasil.



O historiador critica com veemência os privilégios ainda concedidos a parlamentares. Além dos bons salários, ele lembra que os deputados e os senadores recebem ajuda de custo para moradia, transporte, entre outros. “São estruturas e privilégios de um antigo regime. Os custos são muito elevados para mantê-las, ainda mais se considerarmos o que realmente ela representa em termos de benefícios ao bem comum”, pondera.



O cientista político Octaciano Nogueira acredita que a Constituição Federal de 1988, que tanto marca a Nova República, nunca foi completamente testada pela sociedade. “Ela é a mais extensa e complexa constituição da história do País, e já recebeu 63 emendas. Há muito para se organizar ainda”, diz. Para ele, o texto possui virtudes e defeitos.



A maior virtude da Constituição de 88, na opinião do cientista político, é a carta de direitos individuais e políticos do texto. O maior defeito é ser extremamente detalhista e regulatória. “Uma constituição que tabelava juros. É muito minuciosa e isso a torna inviável de ser cumprida”, lamenta.



Para Francisco Assis, o texto foi importante para definir direitos. Porém, lembra que a solução de problemas não depende só de leis. “Não é por falta de leis, regras e normas que não resolvemos os problemas que temos, ao contrário do que a tradição brasileira diz. Temos leis até demais. A mobilização social é essencial”, opina.

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