sexta-feira, 23 de novembro de 2012

"Há um grande déficit de justiça entre nós"



Após receber homenagens na cerimônia de posse no Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa destacou o direito à igualdade e a necessidade de independência no Judiciário: "É preciso reforçar a independência do juiz. Afastá-lo, desde o ingresso na carreira, das múltiplas e nocivas influências que possam paulatinamente lhe minar a independência"
 
"Prometo bem e fielmente cumprir os deveres do cargo, em conformidade com a Constituição e as leis da República", jurou um sorridente Joaquim Barbosa ao lado de uma séria presidente Dilma Rousseff. Foi assim que o relator da Ação Penal 470 tomou posse na presidência do Supremo Tribunal Federal (STF), para, em seguida, convidar o ministro Ricardo Lewandowski a fazer o mesmo juramento, que o levaria à vice-presidência da Corte Suprema.
 
"O Brasil é um pais em franca e constante evolução", iniciou seu dircurso de posse o novo presidente do STF. "O juiz deve sim sopesar e ter na devida conta os valores mais caros na sociedade na qual ele opera. O juiz é um produto do seu meio e do seu tempo, disse, acrescentando: "A Justiça por si só e só para si não existe". "Há um grande déficit de justiça entre nós", disse Barbosa, dizendo que deseja um Judiciário "sem firulas, sem rapapés". "Nem todos os brasileiros são tratados iguais", acrescentou.
"É preciso reforçar a independência do juiz. Afastá-lo, desde o ingresso na carreira, das múltiplas e nocivas influências que possam paulatinamente lhe minar a independência", destacou o novo ministro do Supremo, que foi aplaudido ao destacar a distância que os magistrados têm de ter do poder partidário. "Nada justifica a busca de apoios para a singela promoção de um juiz da primeira e segunda instância", disse.
 
Ao fim do discurso, Barbosa fez menção a "minha querida mãezinha, senhora Benedita da Silva Gama. Meu querido filho, Felipe Barbosa Gomes". Ele também destacou a presença dos convidados que vieram do exterior para acompanhar sua posse.
 
Cerimônia
 
A cerimônia de posse começou com o registro da presença de governadores, como o de São Paulo, Geraldo Alckmin, da Bahia, Jaques Wagner, e de Minas Gerais, Antonio Anastasia. Mas também de atores, como Lucélia Santos, Milton Gonçalves, e cantores, como Martinho da Vila. Coube ao bandolinista Hamilton de Holanda, a pedido de Barbosa, tocar o hino nacional que deu início aos trabalhos.
 
Consumada a posse, o ministro Luiz Fux fez, também a convite de Barbosa, uma apresentação do currículo do novo presidente da Corte Suprema. Fux destacou o julgamento sobre o direito ao aborto de fetos anencéfalos, conduzido por Barbosa. "Timbra-lhe a humanidade, a sua aproximação com o povo", discursou Fux, acrescentando: "Joaquim Barbosa, um paradigma da cultura, da coragem, da honradez".
 
Fux, que também prestou homenagem a Lewandowski -- "A sua contribuição é digna de nota nas controvérsias sobre direitos humanos a estabilidade das instituições democráticas" -- e ao ministro aposentado Carlos Ayres Britto. Após destacar as causas da minorias e defender o poder Judiciário, Fux fez menções à presidente Dilma e disse que "o céu ainda não é de brigadeiro, mas o voo é de condor". "Nós, juizes, não tememos nada ou a ninguém", disse. Antes de terminar o discurso, Fux ainda citou o pai de Barbosa, já falecido, Nelson Madela e Martin Luther King.
 
Falando em nome do Ministério Público, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, iniciou seu discurso elogiando Ayres Britto. "A renovação do Supremo Tribunal Federal é a construção do nosso sistema de Justiça", disse Gurgel. Em seguida, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, discursou: "ainda corremos contra o tempo para resgatar a antiga déivida que um processo de colonização nos relegou". Ophir foi aplaudido quando disse que quem infringe a lei deve ser julgado.
 
Evento
 
Uma longa fila na entrada, celebridades entre os 1,5 mil convidados e as atenções de dezenas de câmeras de tevê. Poderia ser a estreia de um filme, mas era a posse de Barbosa na presidência do STF. Celebrizado pela condução rígida da Ação Penal 470, o ministro caiu nas graças da parcela da população que enxerga no julgamento do mensalão um avanço no combate à corrupção no Brasil. Não bastasse, Barbosa é celebrado como o primeiro negro a chegar ao posto mais alto da Corte Suprema.
 
Foram convidados para a posse os atores Taís Araújo e Lázaro Ramos, além do cantor Djavan. Outras celebridades convidadas são a apresentadora Regina Casé e o tricampeão mundial de Fórmula 1 Nelson Piquet. Coube a Lewandowski convidar o deputado Romário (PSB-RJ), que disse estar "feliz" com a posse de Barbosa.
 
"Eu, também como negro, fico feliz de saber que temos uma pessoa competente, um trabalhador, objetivo, honesto, sério, que vai assumir o maior cargo do pais no Poder Judiciário", disse. Martinho da Vila disse que a posse de Barbosa é um evento que "já devia ter acontecido há muitos anos e finalmente aconteceu".
 
Ausência
 
Entre os convidados, uma ausência deve ser mais notada. Em viagem pelo continente africano e à Índia, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não fez muita questão de comparecer à posse do ministro que, entre outros, indicou para o STF. A ausência foi inevitavelmente associada à mão pesada de Barbosa no julgamento do maior escândalo do governo Lula. A rigidez de Barbosa no caso, que beirou o autoritarismo em alguns momentos, levou alguns colegas a temer pela presidência de Barbosa.
 
A primeira sessão que ele presidiu, contudo, tratou de amenizar as preocupações. Nesta quarta-feira, o julgamento da Ação Penal 470 seguiu tranquilo sob a condução do relator do processo, que mereceu até elogios do colega Marco Aurélio Mello, um dos que mais demonstrava receio com a posse de Barbosa.

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